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Erotico-->24. TODOS PROGRIDEM -- 30/09/2003 - 06:41 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Um relato que abrange vários anos não pode privilegiar o roteiro de sucessos item por item. Claro está que houve, nos dez meses seguintes, muitos eventos importantes, muitas descobertas significativas, muitos percalços esclarecedores, arrufos, querelas, desentendimentos, como também se deram reconciliações preciosas, para a evidenciação de que os diversos integrantes de nossa comunidade dramática aprendiam a conviver.

Resumiremos, pois, para informar que Plínio e Margarida foram preenchendo os vazios dos cômodos, com móveis e utensílios novos, havendo dado certo o pequeno negócio que os três sócios encetaram. Até um carro de segunda mão, em excelente estado, veio estacionar em sua garagem.

No centro espírita, Plínio foi desenvolvendo a mediunidade, tendo deixado de escrever nomes famosos na atribuição da autoria dos textos. Aliás, muitas vezes, omitia a informação correta que lhe era fornecida pelo mensageiro, sempre que constatava que as lições poderiam servir a mais de uma família. Mas não se constrangia quando lhe pediam para escrever comunicações de suprema consideração e conforto.

Notável foi sua percepção de como fazer para captar com precisão os sentimentos e as idéias que lhe ditavam, de modo que não demorou para exprimir-se em linguagem coloquial ou formal, conforme exigiam os temas, de acordo com os gêneros. Inclusive, dava passividade bastante razoável para manifestações poéticas de caráter popular. Foi quando começou a ler os textos espíritas de feição mais literária, porque aspirava a escrever livros de contos ou mesmo romances. Nisto, porém, não punha muito empenho. Era simplesmente uma aspiração íntima, reflexo, com certeza, daquela mensagem a respeito dos herdeiros mediúnicos do Chico Xavier.

Moacir e Silvinho conferiram ao sócio mais velho todas as responsabilidades das decisões mais dificultosas, mas foram inovando no campo da eletrônica, instalando diversos aparelhos computadorizados, para se implementarem programas mais completos de contabilidade, no interesse de ampliação da área de atendimento, sem a contratação de muitos funcionários. Mesmo assim, a firma acabou precisando de mais cinco pessoas, tanto foi o prestígio comercial alcançado no campo da terceirização de serviços.

Bem mais tarde, vamos adiantar, os mesmos recursos foram levados ao centro espírita, de molde a facultar ao médium Plínio que dedilhasse o teclado para a escrita direta na tela do vídeo dos textos que recebia em particular. Dali para a impressora e desta para as mãos dos dirigentes da entidade era uma questão de minutos, de sorte que o controle da qualidade do serviço mediúnico não permitia desvios de conduta doutrinária. Quando as idéias avançavam em rota de colisão contra os ensinamentos de Kardec, Plínio analisava atento as recomendações dos mais experientes e dava sumiço nas composições menos confiáveis, selecionando e “deletando” definitivamente as ameaças ao bom desenvolvimento das tarefas espíritas daquele profícuo grupo de socorristas encarnados.

A história dessa harmonia interna entre os diferentes departamentos do centro também não aconteceu sem idas e vindas, sem contrariedades e sem ferimentos sérios no amor-próprio dos que se envolviam nas discussões, quando Plínio ainda estava imbuído de que o seu trabalho merecia a assistência superior dos guias espirituais da entidade terrena. Enquanto não se compenetrou de que os amigos do etéreo desejavam o progresso de todos os pupilos, através da conquista pessoal do conhecimento doutrinário, não admitiu estar sendo testado quanto ao teor das comunicações. Um dia, recebeu um texto completamente avesso a um ponto essencial de O Livro dos Espíritos, acrescentando nova lei ao decálogo mosaico e interpretação diversa aos princípios emanados diretamente dos mentores do codificador, de sorte que teve de convir que estava abrindo o coração de forma aleatória. Reconheceu que isso seria perigoso, se desse total credibilidade às informações. Foi assim que se pôs à disposição para os comentários dos colegas de mesa mediúnica e favoreceu as críticas dos espíritos que quisessem colaborar com os esclarecimentos necessários ao conhecimento da verdade. Continuou sonhando com os livros de contos e os romances mas colocou-os muito mais remotos na linha do porvir.

Margarida recuperou-se da debilidade mental, apesar de, no começo, voltar a apresentar algumas ligeiras crises, em especial por pensar muito nos dois filhos distantes. Ari não mais se manifestou no centro, mas a mãe adquirira cabal confiança em que fora perdoada de possíveis falhas na criação e educação do rapazelho, de modo que fixou a idéia de que, pelas informações espíritas, iria demorar para o filho reaver, se é que alguma vez tivera, o equilíbrio existencial.

Não colocava as coisas nesses termos mas caminhava celeremente para superior entendimento da lei de ação e reação, tanto que ajudava as pessoas no centro, nunca menos de duas horas a cada dia, havendo épocas de dedicação exclusiva.

O lar tornou-se para ela o refúgio das pressões sociais. O aparelho de televisão não se recuperou, o rádio não se apresentou de volta e até as reproduções fonográficas se resumiram às músicas selecionadas que se ouviam nos momentos de espera das atividades públicas, na casa de atendimento espiritual.

Tendo concentrado o interesse no empenho da colaboração fraternal, reduziu drasticamente as funções de cozinheira. Limpava os cômodos sem o antigo elã, apenas para manter o ambiente livre dos germes e da poeira. Com isso, podia manter o marido e a si mesma com o peso do tempo das “vacas magras”, sem nenhum esforço ou preocupação. Não corria, porém, o risco de cair de novo nas garras da anemia, porque Plínio estava atento para que a alimentação elegesse as vitaminas e proteínas como o prato mais saudável.

Um belo dia, mantiveram a seguinte conversa:

— Querida, se eu fosse buscar uma pizza...

— Nem pensar. Qualquer refeição que possa ser interpretada como de regozijo eu não aceito, não sem antes reunirmos de novo toda a família.

A reprodução acima pode passar aos leitores a falsa idéia de que ambos não se falavam muito. Não é verdade. Os diálogos eram freqüentes e substanciosos quanto às descrições de tudo o que ocorria na comunidade espírita. Enquanto Margarida dava ao marido as notícias dos eventos sociais, este a mantinha informada de todas as manifestações mediúnicas.

Referimo-nos a recaídas de ânimo. Isto aconteceu até que receberam a primeira carta de Anacleto.

Vamos saber, em lugar de ler a missiva, o que deu impulso à comunicação.

Cleto, durante algum tempo, percorreu várias sedes da igreja, repetindo o discurso de integração nos ideais religiosos da instituição. Sempre acrescentava um tópico ou outro que facultasse estremecimentos sentimentais. Um belo dia, no auge da descrição das desgraças da família, impôs-se a referência à perda de Ari, demonstrando, pelos dispositivos da argumentação, que o pequeno era prestativo e se esforçava por realizar tudo o que o mais velho pedia. Nesse diapasão, partiu para a atribuição da culpa do consumo das drogas a si mesmo, sem atenuantes de vulto, esquecido de revelar que o pai era um ausente e que a mãe queria o menino a realizar os serviços domésticos, faltando apenas colocar-lhe roupas de mulher. Referiu ao fato de Ovídio ter sido preso e à necessidade de ele mesmo escafeder-se, abrindo ao mais novo as portas ao vício sem freios.

Nessa altura do testemunho, como pedia o roteiro, deveria entregar-se às lágrimas compungidas do arrependimento. Entretanto, naquela oportunidade, feriu uma corda real de seu coração, impregnando-se a mente com a figura do irmão, como se estivesse presente no auditório, a olhá-lo, à espera da voz de comando para as atividades do tráfico. Bateu-lhe a saudade de frente, onda inesperada de emoções que o elevou acima do fundo arenoso, pondo-o a flutuar sem achar pé na narrativa que trazia decorada. Afogou-se quase no pranto vertido e precisou ser amparado pelos obreiros e pastores, que não desconfiaram da autenticidade do desempenho.

O povo se condoeu pelo sofrimento evidenciado e, naquele dia, obteve o índice mais alto de convencimento de que a conversão se dera por obra e graça de Jesus, sob as preces e rogos da congregação. Ovídio, no entanto, percebeu que Cleto estava verdadeiramente derreado, desenvolvendo ele mesmo um sentimento misto de saudade e de ternura pelo falecido.

Durante toda a semana, debateram os irmãos a respeito da novidade e chegaram à conclusão de que os pais, muito mais do que eles, deviam estar sofrendo com a perda do filho, atribuindo aos mais velhos a responsabilidade pelos acontecimentos funestos. Foi o que deu coragem a Cleto de escrever, pedindo-lhes que compreendessem o quanto os dois estavam magoados com os efeitos de sua ganância pelo tráfico e pelo vício. Não definiu, porém, qual era a sua função na igreja, mas deixou claro que estavam sob o amparo de Deus, sob o resguardo do “egrégio” corpo eclesiástico responsável pelas pregações da palavra sagrada do Senhor.

— De onde terá vindo esse “egrégio”? — perguntou Margarida a Plínio.

— Da mesma fonte que estimulou as palavras sentidas do arrependimento e do pedido de perdão. Não importa que tendência protestante esteja por detrás deles. Eu acho que, se estão afastados das drogas, devemos agradecer a Deus e aos espíritos amigos, porque, sem eles, com certeza, estariam com o irmão na erraticidade.

— Você acha que devemos responder, dizendo que Ari se manifestou no centro?

— Tudo o que for verdade deve ser dito. Se eles vão ou não acreditar, é outra história. O que está me dando medo é ficar mandando a correspondência em nome de Cleto ou de Vidinho. Vamos escrever para o endereço do remetente, do mesmo jeito que Cleto fez, ou seja, para o pastor Moisés.

Foi assim que começou a troca de cartas que redundaria num abraço de reconciliação, ao cabo daqueles dez meses a que nos referimos.

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