Auto-Retrato de José Lins do Rego*
-Tenho quarenta e seis anos, moreno, cabelos pretos, com meia dúzia de fios brancos, 1 metro e 74 centímetros, casado, com três filhas e um genro, 86 quilos bem pesados, com muita saúde e muito medo de morrer. Não gosto de trabalhar, não fumo, não durmo com muitos sonos e já escrevi 11 romances. Se chove, tenho saudades do sol; se faz calor, tenho saudades da chuva. Vou ao futebol e sofro como um pobre diabo. Jogo tênis, pessimamente, e daria tudo para ver o meu clube campeão de tudo. Sou homem de paixões violentas. Temo os poderes de Deus, e fui devoto de Nossa Senhora da Conceição. Enfim, literato da cabeça aos pés, amigo dos meus amigos, e capaz de tudo se me pisarem nos calos. Perco então a cabeça e fico ridículo. Não sou mau pagador. Se tenho, pago; mas se não tenho, não pago, e não perco o sono por isso. Afinal de contas sou um homem, como os outros. E Deus queira que assim continue. (Ano de 1947)
(*) Paraibano de Pilar -Pb. Nasceu a 3 de junho de 1901 e faleceu a 12 de setembro de 1957. Um dos melhores escritores regionalistas da Paraíba. Autor de: Menino de Engenho (1932); Doidinho (1933); Banguê (1935); Usina (1936); Fogo Morto (1943); Pedra Bonita ( 1938); Cangaceiros (1953); O Moleque Ricardo (1934); Pureza (1937); Riacho Doce (1939); Água Mãe (1941); Eurídice ( 1947); Meus Verdes Anos ( 1956).
Inúmeras conferências e artigos jornalísticos; relatos e cronicas. Atuou no "Globo" e "Diários Associados" do Rio de Janeiro.
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