Quando eu lá cheguei estavam verdes as uvas.
A parreira, de uma beleza só.
─ Pena que vou logo embora e as uvas estão verdes ainda.
─ É pena mesmo. Costumam ser tão doces as uvas daqui.
─ Tia, esta sua casa é muito aconchegante e o quintal é um encanto.
─ Não está mesmo lindo? Viu as primaveras como estão floridas?
─ Sabe tia, nós dizemos primaveras, mas o nome correto é buganvílias. Acho tão lindo chamá-las assim.
─ É mesmo bonito!
─ Eu estava a pensar que você e minha mãe adoram plantas, flores. Vivem no jardim. Vocês são tão diferentes em alguns aspectos e em outros tão semelhantes. Nunca soube de uma planta que você ou minha mãe tenha plantado que não tenha pegado. Vocês nasceram com mãos de fada. E os doces então! As duas adoram, as duas preparam...
Faz tanto tempo que este fato ocorreu. As falas foram mais ou menos estas.
As uvas, eu não as provei. As vi verdes e amadureceram. Outros as apreciaram. Outras colheitas aconteceram.
Bateu uma saudade de minha tia distante. Uma saudade de seu abraço, de seu jeito exagerado, de seus olhos azuis.
Comecei a recordar outros fatos, outros dias, outros tempos.
Cheguei até ao meu tempo de menina. Os vestidos bonitos que ela costurava para mim. Por instantes cheguei a sentir a prova. Meu corpo infantil. Suas mãos. Os alfinetes...
A sensação de suas mãos fazendo ajustes.
─ Nunca vai engordar menina?
Resolvo olhar uma fotografia que foi tirada naquele dia das uvas verdes, próximo à parreira. Será que elas saíram na foto?
Recordo que o retrato está com minha mãe.
As lembranças precisam me bastar hoje porque a saudade está machucando um pouco. Saudades de muita coisa que já passou. Saudade de tanta coisa bonita que meu coração guardou.