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Erotico-->AS AVENTURAS DO PADRE DEODORO EM CAMPOS ETÉREOS — XL -- 26/08/2003 - 06:55 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A sós, Margarida e Deodoro envolveram-se num amplexo do mais puro amor. Nunca haviam experimentado a sensação do doar-se tão integralmente. Foi Deodoro quem se apartou da amiga, recatado, como se estivesse ferindo algum preceito religioso.

— Meu amor, disse-lhe ela, você precisa aprender como se dá o convívio entre os espíritos irmãos. Freqüentei as aulas do Professor Joaquim...

— O meu companheiro de viagem?

— Não do Padre Joaquim mas de seu homônimo encarregado das turmas de fixação dos conceitos espíritas. Dentre os problemas que trazemos da carne...

— Posso adivinhar?

— Você leu em minha mente.

— Brincadeirinha!

— Então vamos falar a respeito do amor e do sexo entre os espíritos, tema que você não encontrou nas obras de Kardec.

— Como não?! Posso até citar-lhe um trecho significativo.

— Vamos lá!

— Em “O Livro dos Espíritos”, na questão de número duzentos, Kardec perguntou: “Possuem sexos os Espíritos?” Eis a resposta que obteve: “Não como vocês o entendem, pois os sexos dependem da estrutura dos órgãos. Existe entre eles amor e simpatia, mas sedimentados na similitude de sentimentos.” Não é bem isso o que nos está acontecendo?

— Essa é a resposta que Kardec admitiria, segundo a sua moralidade terrena, pela responsabilidade social da divulgação da doutrina em nível compatível com a compreensão burguesa da civilização em que estava imerso. Por que foi que Kardec não instigou os benfeitores no sentido de explorar a escala espírita?

— Tenho medo de que as suas explicações, se vier a escrever as minhas aventuras, não poderão figurar na obra, porque deveremos contrariar a escrita do Codificador.

— A escrita, certamente, mas Kardec era muito mais evoluído do que o povo que o rodeava, tanto que, comentando a questão de número duzentos e dois, afirmou: “Os Espíritos se encarnam homens ou mulheres, porque eles não possuem sexos.; como eles têm que progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, lhes oferece provações e deveres especiais e a oportunidade de adquirirem experiência. Quem fosse sempre homem saberia tão-só o que sabem os homens.”

— Dessa forma, justifica-se a informação de Eufrásio quanto às novas encarnações de meus pais. Mas não vejo relevância em levar aos mortais que os espíritos menos evoluídos, tanto quanto têm a sensação de que comem e bebem, com as conseqüentes reações orgânicas da digestão, também têm ânsias eróticas, mantendo o aparato reprodutor em estado de uso. Imagino que muitos vão às casas de prostituição, para se espojarem nos lamaçais dos vícios.

— Vejo que o ideário do Monsenhor orienta ainda os seus princípios científicos. Poderíamos escrever um tratado de sexologia, de maneira completamente isenta de malícia, que você, mesmo assim, teria receios fundamentados na ignorância dos leitores para não transmiti-lo mediunicamente. Façamos o seguinte: conversemos livremente na intimidade de nossa confiança e amor. Depois, você analisa o que pode oferecer aos leitores encarnados, eliminando os aspectos que poderiam causar engulhos por grotescos, por inusitados e por ofensivos aos pruridos de santidade dos que temem mais pelos outros do que por si mesmos.

Foi assim que Deodoro descobriu que vinha raciocinando em função dos textos que o preocupavam.

— Você tem razão, querida.

O tratamento afetuoso repercutiu de forma muito estranha no contexto filosófico do pensar habitual do teólogo. Mas Margarida estava atenta para as nuanças sentimentais do amigo e acudiu-o logo:

— Meu amigo, não se acanhe quanto a me considerar um espírito como qualquer outro. Sei que muito teremos de lutar contra as idiossincrasias que se acumularam em nossas personalidades, durante estes últimos trezentos ou quatrocentos anos. Não haverá de ser de um dia para o outro que iremos tornar as nossas reações as mais justas e perfeitas, em obediência às regras cósmicas, universais ou morais.

— Você está saindo-me melhor do que a encomenda. Que a tornou tão ponderada, desde que fugiu com o marido de outra?

— Nestes últimos tempos, desde que você e seus amigos saíram em peregrinação, após terem sido atropelados no mosteiro, busquei entender-me com aquela mulher, encontrando-a disposta a perdoar-me, tanto que foi mais feliz com o homem de quem recebeu amparo do que eu ao cuidar de um bêbado e de numerosa prole de débeis mentais. Foi assim que me deteriorei e desencarnei, moída de remorsos por haver abandonado o convento. O sofrimento ensina e a dor purifica.

Lágrimas abundantes impediram-na de prosseguir. Deodoro abraçou-a mas não lhe compartilhou dos frêmitos emotivos. Não via razão para semelhante distúrbio psíquico:

— Margarida, não creio que o futuro nos reserve surpresas desagradáveis. Enquanto me debatia em meio das cruéis recordações dos atos infelizes que pratiquei contra as pessoas mais próximas, justamente aquelas a quem devia respeito e carinho, fui compenetrando-me das verdades do trabalho de restauração dos vínculos rompidos. Deus é pai de misericórdia, segundo a cediça expressão que todos repetem mais ou menos conscientemente.; mas é isso mesmo. Se agirmos em consonância com os ditames das normas estatuídas para os socorristas, que tenho visto atuando serenos e soberanos em relação às dores alheias, iremos deixar para trás os rancores que tanto nos atemorizam, porque estaremos aptos a compreender que todos somos filhos do mesmo Pai Celestial. Vi que você se dedicava aos pobres párocos em expectativa de serem soerguidos para poderem adentrar o Paraíso. É sobre esse tipo de tarefa que estou falando. Você sabe, bem melhor do que eu, aproximar-se das pessoas para oferecer-lhes adequado remédio. Quanto a mim, venho apresentando enormes dificuldades nesse setor. Gosto de ficar desenvolvendo as idéias e, se me deparo com alguém desequilibrado, logo desisto de convencê-lo, porque sei que cabe a ele conformar-se às leis e mudar de atitude.

À vista do restauro das forças emocionais da companheira, prosseguiu o seu longo discurso, imprimindo outra direção aos temas:

— Surgiu-me uma dúvida quanto ao seu crescimento espiritual. Você veio do monastério para cá ou terá oferecido o seu concurso espontâneo para atender, na qualidade de missionária da colônia, aos sacerdotes necessitados?

Margarida não pôde reprimir um sorriso compreensivo:

— Faz-lhe falta, querido, uma planta da colônia. A ala de atendimento aos infelizes é subterrânea, vamos dizer assim, porque o plano em que a colônia se construiu é mais elevado. Nos subsolos, encontram-se diversos corredores que vão dar em comunidades organizadas segundo credos religiosos ou padrões de valores (comerciantes, profissionais liberais, operários, campesinos etc.), tudo em conformidade com a semelhança vibratória das respectivas populações. A essa parte do hospital têm acesso os médicos, paramédicos e demais pessoal que atende na área da saúde.

— Perispiritual, naturalmente.

— Preferentemente, embora muitos dos especialistas atuem diretamente nas afecções espirituais provocadas pelos distúrbios psicológicos.

— Quer dizer que, na verdade, ao fugir da colônia, fui apanhado pelo Crisóstomo na parte externa...

— Você se esgueirou por dentro de uma construção adrede preparada para proteger os perturbados que não se conformam com as primeiras informações recebidas dos mentores e protetores. Se tivesse caído nas mãos de seres de maior perversão, receberia descarga fluídica de efeitos desastrosos para a sua delicada compleição intelectual.

— Significa que fui o tempo todo assistido pelos beneméritos amigos desta colônia?

— Estranha-me que não haja percebido isso antes.

— Claro está que, assim que me deparei na companhia dos que comigo se viram expulsos do mosteiro, sempre tive a sensação da sutil presença de Eufrásio ou de meu anjo guardião. Não imaginei que, no túmulo da consciência, que é como denomino aquela região em que permaneci algum tempo...

— Seis anos, meu caro.

— Inacreditável!

— Pois você irá deparar-se com outros informes igualmente surpreendentes, até que saiba reconhecer o sistema que vige nestas paragens, tendo em vista a construção mental do universo tangível pelo nosso organismo “semimaterial”, segundo a conceituação kardequiana.

Deodoro pôs-se a conjeturar a extensão da permanência em cada setor freqüentado desde que regressara da esfera carnal. Não foi, todavia, capaz de definir os limites de tempo de cada atividade.

— Em que ano terreno estamos exatamente hoje?

— Em qual você espera estar?

— Pelas informações colhidas na enciclopédia e pelas datas que apreendi durante a minha passagem espírita pelo orbe, deveríamos estar em mil e novecentos e noventa e três, se não gastei muito tempo de lá para cá.

— Esse é o ano em que os mortais se encontram. Na colônia, estamos no ano trezentos e vinte e sete, porque marcamos a data da fundação como o mais importante para quem aqui mora. É simples questão de economia, porque assinalamos as realizações em função do crescimento da instituição. Se fôssemos comparar a nossa progressão com os eventos da Terra, provavelmente estaríamos por volta do ano três mil e quinhentos, pouco mais ou menos, que é a data aproximada em que as instituições humanas terão condições de se cotejarem com as nossas atuais. Aqui reside a principal dificuldade para os que chegam e se deparam com avanços tecnológicos incompreensíveis, segundo o prisma científico haurido na Terra.

Deodoro não se preparara para a descrição. Via os aparelhos e sabia que se mantinham funcionando por alguma fonte energética própria do plano etéreo. Mas não lhe passou jamais pela cabeça investigar tão grosseira realização, dado o campo de atuação se situar no âmbito das forças físicas. As explicações de Margarida remetiam-no para a concepção espiritualizada das máquinas transcendentais, porque lhe foi passado nas entrelinhas que todas as soluções tendiam para a ajuda evangélica dos semelhantes, segundo o princípio cristão do amai-vos uns aos outros. Se conforto existia, era inerente ao trabalho realizado, ou seja, Deodoro chegou à conclusão de que o plano em que se manifestava como ser nesse instante jamais houvera sido morada sua, em toda a sua existência.

— Querida, devo regozijar-me por ser recebido nesta casa com a mesma alegria de que me veria possuído se adentrasse o paraíso? Estar aqui representa um passo adiante na caminhada rumo ao Senhor?

— Pequenino passo, meu amor, que deveríamos prescrever para quantos se situam nas planícies dos vícios, dos destemperos do humor, das presunções de sabedoria.

— Kardec, com os espíritos que lhe ditaram as mensagens de luz, afirma que ninguém retrocede em sua caminhada. Quer dizer que evoluí e que estou no primeiro degrau para um novo patamar na escala espírita?

— No mesmo degrauzinho que eu, meu caro.

— E a que devo essa projeção no campo espiritual?

— No amor que tem espargido em torno de si, arrebanhando as pessoas que se aproximam para a alegria e a felicidade do entendimento das leis de Deus, aquelas que se assinalaram no Decálogo mais as que foram referendadas pelos irmãos de luz e que se inscreveram em “O Livro dos Espíritos”.

— Mas é tão simples assim?

— Essa é uma observação que servirá de mote para algumas aulas no próximo curso em que você se matricular na condição de pré-escolar.

— E quando vai ser isso?

— Assim que você se houver entendido com os seus pais e, talvez, com alguns antigos desafetos, conforme os critérios dos orientadores da área da educação.

— E se não houvesse nenhuma colônia como esta, será que os seres obteriam as mesmas informações e solidificariam os conhecimentos do etéreo com o mesmo rigor? Em suma, para não aborrecê-la mais com perguntas, se dedicar-me a reproduzir este diálogo para os mortais (eis que esta preocupação vai tornando-se no “leitmotiv” de minha existência), não irei fomentar a mesma dúvida, afastando do Espiritismo os que se virem habitando, desde logo, aqueles casarões mal-assombrados das pessoas que não possuem o dom da reflexão ou não se estimulam para a prática do amor nos termos bíblicos?

— Pense na pequena comunidade agrária pela qual o seu grupo passou a caminho do orbe. Teriam aqueles seres o sentido da perversão da divina justiça ou marcavam passo, enquanto aguardavam por novos embates na carne? A luta há de ser o privilégio dos que desejam ascender. Foi-se o tempo da inocência, quando se pensava bastar a confissão dos pecados para se obter o perdão de Deus e o ingresso em seu Reino de Eterna Felicidade. Agora, temos a obrigação, já que o caminho se encontra aberto, de devassar as noções do etéreo em proveito dos encarnados. A partir daí, que percorram os ensinamentos dos avatares e instituam para suas vidas que o melhor que desejam para si mesmos é o que devem ofertar ao próximo, como fez a viúva do óbolo. E não reproduza em sua obra o texto sagrado. Deixe para os encarnados algum trabalho de pesquisa, caso contrário, vão pensar que tudo tem caído do céu para você e não entenderão os suores, as lágrimas e o sangue que você tem derramado para alcançar proficiência nos temas que ousa desenvolver.

Concentrou-se o Monsenhor nas palavras da amiga, para ver se encontrava algo que fosse impossível para ele mesmo ter dito. Convenceu-se de que a companheira não deveria estar totalmente certa em responsabilizar cada ser pelos seus atos de superação dos problemas e dificuldades, porque ela mesma se contraditava pela atuação junto aos enfermos.

— Se depender de mim, observou-lhe, vou transcrever quantas passagens puder para esclarecimento ou abonação de minhas teses, porque sei que os mortais se louvam nas palavras do Senhor, que é como têm em conta os textos sagrados.

— Então, não se esqueça de citar Kardec, quando afirma que nem tudo o que se inscreveu na “Bíblia” pode ser explicado sem as luzes do Espiritismo.

— Sei de cor a passagem, que merece reproduzida nesta oportunidade. Encontra-se em “A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo”, item quarenta e um do capítulo primeiro: “O Espiritismo, bem longe de negar ou de destruir o Evangelho, vem, ao contrário, para confirmar, para explicar e para desenvolver, através das novas leis da natureza que revela, tudo o que disse e fez o Cristo.; ele traz luz sobre os pontos obscuros de seu ensino, de sorte que aqueles para quem certas partes do Evangelho eram ininteligíveis ou pareciam inadmissíveis as compreendem sem dificuldade com a ajuda do Espiritismo, e as admitem.; eles percebem melhor sua importância e conseguem distinguir a realidade da alegoria.; o Cristo lhes parece maior: não é mais simplesmente um filósofo.; é um Messias divino.”

— Mas Kardec punha em dúvida a precisão dos textos evangélicos, sabendo serem raras as falhas, mas existirem. Repita para mim o comentário a respeito da fidelidade de reprodução das palavras de Jesus que se encontra no item quarenta e cinco do capítulo dezessete da mesma obra, por favor.

— “Temos de duvidar disso, se pensarmos que ele não escreveu nada.; que elas foram recolhidas apenas após sua morte.; e, quando vemos o mesmo trecho quase sempre reproduzido em termos diferentes em cada evangelista, é uma prova evidente de que não são as expressões textuais de Jesus. É provável, por outro lado, que o sentido tivesse sido alterado, às vezes, ao passar por traduções sucessivas.”

— Teria você algum comentário seu a oferecer sobre as considerações de Kardec?

— Está visto que, se me outorgasse o direito às críticas do ponto de vista do teólogo, diria que Kardec não era autoridade para expedir conceitos sobre a exegese dos textos bíblicos. Contudo, devo admitir, como espírita neófito, que estava amparado pelo “Espírito de Verdade” e que, com certeza, obtivera autorização para emitir os conceitos pela forma que o fez. A mais não me atrevo.

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