Usina de Letras
Usina de Letras
169 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62272 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10451)

Cronicas (22539)

Discursos (3239)

Ensaios - (10381)

Erótico (13573)

Frases (50661)

Humor (20039)

Infantil (5452)

Infanto Juvenil (4778)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140816)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6204)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->O retrato -- 14/03/2004 - 23:30 (Manoel Carlos Pinheiro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ansiedade. O passado a tomar conta de seus pensamentos. A foto é tudo que restou do seu caçuá de lembranças. Vinte anos depois ele se prepara para enfrentar os seus fantasmas. Sempre que se programou para esta viagem, cedeu à pressão da mulher que prefere a Europa ao Sertão. Espera reencontra-se no seu mundo infantil, intocado na lembrança. Analisa mais uma vez a foto.

Há dias, tirou uma cópia e enviou a Raimundo, Mundinho de Seu Afonso. Pediu que ele reunisse toda a turma. Lembrou mais que o nome de cada um, descreveu seus sonhos e ambições; contou casos daquela época; começou a desenterrar o mundo perdido, mas não esquecido.

Com tudo pronto para a partida, chegou a carta de Mundinho.

Elisa não se tornou médica, morreu tísica aos dezessete. Almerinda não é maestrina, nem mesmo estudou música, dizem que é meretriz, sabe-se lá onde. Heloísa não virou freira, casou com um fazendeiro que, numa crise de ciúme, a matou a peixeiradas; alegaram defesa da honra e o absolveram. Givaldo, que a todos encantava com a bola nos pés, jamais jogou no Santa Cruz, nem mesmo no Íbis, entregou-se à calibrina; a cirrose o levou. Dinamérico não é cientista, abilolado, vive de esmolas, nem mais reconhece as pessoas. Augusto não é engenheiro, foi em busca de ouro no Mato Grosso ou Acre, a malária deu conta dele. Ele, Raimundo, não lembrava mais dos planos da infância, não escreve versos, nem pinta quadros, veleidades há muito deixadas de lado. Trabalha na padaria que era de Seu Nonô, casou-se com uma moça de Brejinho, ele não a conheceu.

O progresso? Resume-se à existência de aparelhos de televisão em muitas casas e lâmpadas de sódio em algumas ruas. Não há mais coreto na praça, nem Banda de Música. O campo de futebol virou pasto para os bodes de Seu Honório, parente de Dona Jurema de Seu Valdeci. Não há mais o serviço de alto-falante, todo mundo escuta rádio da capital. Quermesse, ninguém nem sabe mais o que é isto. Ingá, turco, ubaia, araçá, jatobá, pirim... nem ele, Mundinho, se lembrava mais deste tipo de fruta. Laranja-cravo, pixototinha, nem gosto tem. Cocada de batata de imbu, nego-bom e confeito de angico? A lembrança o fez rir muito...

Tentou reunir alguns amigos, mesmo os que não estão na foto. Não há mais amigos dele; aliás ninguém mais lembra dele. Jurema, a bela Jurema, já é avó, nem sombra é daquela que ele conheceu; ninguém acreditaria que ela algum dia foi jovem e bonita.

Guardou a foto, cancelou a viagem; beberá Fojo às margens do Douro.

Manoel Carlos Pinheiro
http://www.agrestino.blogger.com.br/
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui