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Poesias-->Lembrança de uma menina com uma flor na mão (variações sobre -- 11/04/2004 - 16:05 (Isaias Zuza Junior) |
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I.
Fazem os homens a guerra
porque têm os olhos vendados
centrados em espelhos caseiros
que mentem da beleza o ser
humano que se desumaniza.
De onde vêm os raios são
em gênese igual a santa
criação que quer ser Deus
de tamanha ódio que finda
tudo como cria o que é amor.
De onde partem os trovões não
se imagina dom que canta
amor que fica e, sem adeus
reparte, antes, em dois e ‘inda
de grande sabe em tudo se pôr.
Caem os homens sobre terra,
armados, eles não são soldados,
no desengano... alienados, forasteiros
talvez se sentem por não terem
a Terra feito a eles a flor de brisa.
Para onde vão grandes raios
não se sabe homens outros
os que não reconhecem em si
semelhante incompreensível mundo
no que se faz ódio e se faz amor.
E diferente a criatura do outro
lado do mundo mesmo este aqui,
mas a guerra que vejo eu
entendo mesmo longe, fugindo
como o soldado a cá sabe da flor
Que nunca presenciou em sua
terra beleza tão normal em posse
de uma menina alegre na rua
levando numa das mãos um vento
que fica no aroma da flor que leva.
II.
Céu e sombra caíam numa tarde de desespero no mundo
e a fuga dos que não tinham para onde fugir de medo e
do fogo e da farsa das vidas cruzadas numa passarela
qualquer da vida que acontece nas ruas, estas mesmas de
guerra e amor, estas mesmas de procura de um braço, mas
não só braço, mas também a mão que seja de vento e perfume.
Debaixo de céu há passantes que vão aos seus longes e aos seus pertos
e há quem fique quieto com seus olhos e suas mentes atentas ao alheio
da guerra como se nada fosse perto de si, como se nada fosse a mulher
pedindo comida na calçada, o cão latindo, os carros tremendo seus fogos
debaixo de aço rompendo seus longes e seus pertos, como parte de um corpo.
Debaixo de sombra, o posto de gasolina, o barulho e a fumaça da gente
tossindo, da gente falando e da gente como se fosse fumaça no asfalto
e se fosse apenas homens e mulheres longe dos campos, perto dos edifícios
e fosse apenas só e triste, tudo é lembrança debaixo da sombra, como é o
o que há nos sonhos que se acordam de sustos e morrem num sino a badalar.
Mas eu vi tão rara a sensação humana de uns ares carregar
a força de um haste nas forças de umas pétalas e destas era
carregada a força de uma mulher, de alguém que parecia esquecer
dos restos dos homens e das guerras, que sorria em meio
de toda vaga que se abria na construção que seguia de todo dia
feito de uma nuvem de manhã e nuvem de noite e nuvem de sopro.
Era uma menina luzindo prisma na rua fria e cinza, uma menina
se fazendo esquecer mulher, que tinha uma flor numa das mãos,
como se toda aquela mão fosse a terra e não passasse de uma casa
de vidro dando vida a natureza esquecida dos corpos sob a condição
de toda criatura que corre e procura e perde e sorri e chora, e espera...
Um devagar nos passos que não condizia com a realidade do trabalho
mundano fazia apenas meu grito interior soltar-se para a poesia, era só
cantiga que vinha naquele silêncio que caminhava não só no corpo, não
só nos olhos da menina com a flor na mão, com a mão na vida e a vida na flor,
mas porque passou por mim como que passa a vida e a sorte, que eu conheci
ter como areia os pastos de meus olhos, nunca mais vi a menina com a flor na mão.
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