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Poesias-->A CENA -- 26/10/2002 - 23:08 (COELHO DE MORAES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A CENA

-Coelho de Moraes-



No doméstico quotidiano

troca recíprocas de discordâncias

Troca ordenada de réplicas

em exercício de um direito

Um nunca você e nem eu

sendo cada um na sua vez

projeta a cena para o sempre interminável

daquilo que forja o casamento



Diálogo?

Não se trata de escutar

mas apenas repartir pedaços de fala

Cada um com seu direito

Cada um falando a seu tempo

Cada um com seu gozo perverso

Inconseqüente

como ter prazer sem o risco dos filhos



A longa carreira das cenas

de coisas agitadas e inúteis

A justa entre os atores amantes

A forma limitada da tragédia arcaica

Enquanto eu falo comigo

e sustento o meu delírio

-a justa de palavras-

como se o próprio ator-louco

se recusasse a ser autor da fala



Um pode estar aborrecido

e ou outro excitado

Um pode expulsar seus demônios pela fala

o outro que atrair o demônio da outra

tentar um abraço

repelir com força

forçar um beijo

estalar um tapa

para que a cena ganhe em ritmo

É preciso um engano qualquer

que cada um se esforça

atraindo o engano para seu campo

É preciso uma decisão

que cada um se impõe

retirando o prévio acordo decidido



É uma cena sem objetos

É uma cena sem perspectivas

Ela só tem de si a origem

Quando se trata de cenas

falamos, os amantes,

por filas de palavras que jorram

que se batem e explodem

na cara de cada um



A fala, o reflexo

a causa impossível

o suplemento

e a voz do Eu que chora

não há nada que pare a cena

O cansaço de alguém

a chegada de alguém

a agressão-tesão expansivos

mas o querer da cena está no silêncio

Nenhum raciocínio é metal durável

Na cena o casal se desfaz

são des-amantes

são des-atores de uma cena ociosa

lembrando o vômito romano

Soltar para retornar mais tarde

Por o dedo na garganta

(excitar-se ao extremo)

e vomitar caudalosamente

( jorro de argumentos ferino)

Traquilamente

voltar a comer



Falar por último

e castrar a fala do outro

A amante, na mudez, será meu sonho

Ser confessor, presidente, juiz

Dar termo à disputa

Nada há na cena que concorra para a verdade

Tudo na cena se baseia em lance de dados

Ganha quem reter o anel na mão

perde quem não ver o lenço atrás de si



Breve você se livrará de mim

o meu gozo, do meu jorro de sêmen

do que é expulso de mim

no mesmo jorro das palavras

Só a morte pode interromper a frase

Recusar a última réplica é recusar a cena

O herói sempre fala no fim









A ALVORADA DO MUNDO DE AÇO

- Coelho de Moraes –



Acorda manhã-luz se entra em mim em olhos abertos

Se se fala de seu cansaço matutino cálido

Opacos destinos

Deixa que eu sofra como o herói de Goethe

mesmo que eu esteja cansado e queira dormir

Deixa eu dormir e esquecer o cansaço e a dor

Deixa a dor



Acorda noite-luz e sai de meu peito sem trevas fechadas

Se se desgasta tanto quanto o corpo físico é que chove

e se chove deixa fluir essa água da vida

Diz alguém que tanto sofria mas lutava todo dia

todo dia trabalhando na farmácia da esquina



Imagens do ser amado que de noite eu dormia bem

Durmo antes de morrer?

Branco despertar do dia-luz entrando pelas frestas

Morrer da dor ou morrer do dia é questão de espera.



Mas nada disso é muito real

O sentimento de ausência punge

e o telefonema é uma angústia moderna

cuja familiaridade me comove

como os telhados cinzentos

Os ruídos grisados

os caules cinéreos da fogueira apagada

sideral imensidão de mundo

o aço duro cortante das vertentes

mas nada disso é real

Periga ser um sonho nefasto

Nada mais



Em cada natureza habita uma mulher que amo

O cimento cobre o passo de quem ainda não chegou

Folheio o álbum e a natureza me chama

Minha indiferença é pouca

Perto da pintura de cinzas e degradés

num restaurante repleto o glacial me toma

e as risadas e olhadelas

só servem para domar meu espírito

que quer voar no pescoço do sujeito corpulento

que segura meu braço

é o garçon

Que sopa fria!



Uma capa de irreal me cai

cheia de pó

dos lustres sem lâmpadas

A tarde se aproxima e as sombras me guarnecem

Nem quero mais sofrer

Já basta a nata do leite

e esse cartaz que leio o tempo todo

enquanto espero

embaçado atrás da vidraça

a cara do palhaço faz caretas e micagens

banca o besta e eu sinto frio



Você virá?

Não é mais manhã

Já acordei

Mas você virá?

O mundo rola na rua

e eu não façoo falta alguma

O mundo brinca de existência

como se eu o visse por dentro de um aquário

só não vejo a água

o mundo é cinza e está em outro universo

talvez pluriverso

talvez tantos e cinzas e sujos que eu nada sei...

Você virá?



Estou na exatidão

Imerso em mim

Concluído a meu favor

Logo me desvaneço

De mim sumi em fuga

Essa miniatura envernizada de natureza

Não é mais que um ponto sujo na lama do acaso

E dela só vejo o perfil solto no espaço

Mas

Que mundo maravilhoso

É manhã-luz e o sol aquece

Vejo você na calçada







A CADA VEZ DE UM ACASO

-Coelho De Moraes-



Os prazeres de seu imaginário

como um sopro despojado de sua melodia

um jorro contínuo de imagens e figuras

sem ordem nem lógica

um refluir em narrativas

como o choro e grito das Fúrias



A horizontalidade da fala da amante

passando como um rio perpétuo

exala uma história de amor

que o faz escravo de outra amante

sem clara intenção de moral ou qualquer lição

Amar é estar doente

O mundo lhe deve uma cura



Para desencorajar a intenção do sentido

é necessário uma ordem sem significados

Não se deve construir monstros

no caso

monstros que seriam as virtudes

Uma certa filosofia do amor

Uma certa afirmação de uma alegria crônica

e cômica



O apaixonado é montado de pedaços

Uma criatura de suspiros e lágrimas

partes costuradas, membros alienados

sobras da própria vida

um banquete platônico

onde o homem é uma ponte entre dois mundos



Eu que amo lhe passo a arrogância

dos meus pecados

e em troca eu quero

a juventude de sua pele

a memória de lugares

a inocência do imaginário

o seu vazio ocasional









AGONIA DO AMOR ASCÉTICO

-Coelho de Moraes-



Do sabor de uma

ou outra contingência

Do perigo, medo

Da mágoa, medo

Do abandono, medo

As angústias lá estão

como um veneno preparado

móveis e lâmpadas estúpidas

Onde se aquecer não havendo

como Sócrates

o frio da cicuta escorrendo pelo vidro?

o crivo da escuta surtindo

o efeito da pura angústia?

E se eu fizer uma promessa?



O aniquilamento já foi

já ocorreu

Desse aniquilamento, o medo

agora me ocorre

e eu não percebo que ele já foi

A angústia do amor

de um luto que já ocorreu, o medo



Anulemos a amada

com o próprio peso do amor

Objeto grotesco colado no centro do palco

por minha culpa

O meu desejo transferido

para a imagem que parece empalhada

de tão medíocre

A amado, sempiterna, como um agente

Para que eu ame o meu desejo transferido

nada mais

mudo meus modos para que a amada me note

Ascendo a outros planos

já que sou culpado

que venha, então, a punição febril

Corto o cabelo

Uso lentes escuras forjando a reclusão

Estudo a ciência arcaica e inútil

Será forma de punição

excluir a mim mesmo do convívio?

Serei mais amado?

Serei mais digno?

Meu sofrimento será notado?

Sentirão pena de mim?

O luto histérico

que me imponho

será um doce martírio

será um retiro doce

paciente, triste, digno

como convém

O luto que suponho histericamente

um retiro necessário

de bom funcionamento

patético... discreto... pálido



Veleidades!

A vaidade no sofrimento

sofrimento de amor

-veja o que você faz de mim!-

ergo diante de você

a figura do meu desaparecimento



veja como sumo...







ARMADILHA

-Coelho De Moraes-



A figura do encontro

Tempo feliz depois do primeiro rapto

antes do dia a dia

do casamento



Poeira de figuras agitadas

Ordem imprevisível como a mosca que voa

Movimento organizado

Captura da imagem

Exploração extasiada da amada

A doçura do começo

O tempo do namoro

Embaraços e armadilhas

onde me encontro preso

sem trégua

sob a ameaça da decadência



Ao ser preso nessa doçura

qualquer pedrada é suave

Sou um jogador cuja sorte se confirma

no constante quebra-cabeça da felicidade

Eu

enamorado

capturado sob o céu das vermelhidões do poente

emerjo das vertigens de um acaso sobrenatural

O amor depende dos dados

dos vinhos

e de Dionísio



O gozo narrativo

Da boca saem os prazeres

Um saber da história do outro

a amada contando seus gostos

daí eu pulo e flano

leve como o ar

estou livre para me manter na prisão



AUSÊNCIAS

-Coelho-



Por qualquer causa ou duração

a ausência da amada

sugere prova de abandono



Melodias e canções

da ausência amorosa

fazem o peito romper



Viver em eterno estado de partida

mostra a vocação do migrador

eu, que sofro, sedentário

sou deixado de lado como um embrulho qualquer



A mulher dá forma à ausência

ela tece e canta

ela espera e dormita

na sombra do tear

O homem deve saber se alimentar

enquanto espera

de outras coisas

de outras bocas e manjares

de outros lábios doces e salgados

esquecendo excessos e cansaços

O homem é o voraz navegador



O esquecimento pode ser

a ausência bem suportada

pode ser

Momentaneamente infiel

é condição da sobrevivência

pode ser

Suspirar depois de cada sopro incompleto

Respirar depois de cada beijo em si repleto

Gozar os benefícios da imediata lembrança

pode ser



O abraço que funde imagens

de dois se torna um

e eu abandonado me torno

uma imagem descolada

amarela e seca

O presente insustentável

me bloqueia entre dois tempos

dois simples pedaços de angústia

vagueando nas bordas de um tempo

em vai e vem

abrindo o palco da linguagem

e a linguagem – é sabido – nasce da ausência

cria-se aí uma ficção

cria-se aí a obstinação por múltiplos papéis

e o beijo se manifesta

lanhado de suor e esperas



Se não chorar a ausência

o luto se encurta

Aprende-se a esquecer

o sentimento de amor

que se abate sobre a carência

Quero ficar à margem

da amabilidade mundana que me espia

Quero a amada convocada em mim

exposta em meu peito que arfa

Invoco sua proteção

para que o amor ausente

não me transforme

em detrito social



Por qualquer causa ou duração

a ausência da amada

sugere prova de abandono































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