Acho muito interessante a definição de obra dada por Umberto Eco quando diz que “uma obra de arte é um objeto produzido por um autor que organiza uma seção de efeitos comunicativos de modo que cada possível fruidor possa compreender (através do jogo de respostas à configuração de efeitos sentida como estímulo pela sensibilidade e pela inteligência) a mencionada obra, a forma imagina pelo autor”.
Sei que o autor se refere, de um modo geral, a uma obra de arte. Mas discordo quando diz que cada possível fruidor pode compreender a obra e a forma imaginada pelo autor, pois essa configuração de efeitos sentida pela sensibilidade e pela inteligência vai depender, respectivamente, da emoção (ou seja, situação em que se encontre o leitor) e do conhecimento prévio ou historicidade do sujeito enquanto leitor. Noutras palavras, é quase impossível o leitor comprender a forma imaginada pelo autor, uma vez que a produção de sentidos do texto estará sempre distante da produção do texto. Autor e leitor são pessoas diferentes em situações distintas.
E isso o próprio Eco vai apontar ao dizer que “o autor oferece, em suma, ao fruidor uma obra a acabar: não sabe exatamente de que maneira a obra poderá ser levada a termo, mas sabe que a obra levada a termo será, sempre e apesar de tudo, a sua obra, não outra, e que ao terminar o diálogo interpretativo ter-se-á concretizado uma forma que é a sua forma, ainda que organizada por outra de um modo que não podia prever completamente: pois ele, substancialmente, havia proposto algumas possibilidades já racionalmente organizadas e dotadas de exigências orgânicas de desenvolvimento”.
Fico pensando com os meus botões: até que ponto a crítica literária contribui para a formação de uma literatura sólida e consistente e ao mesmo tempo fonte de prazer? Atualmente parece que os prazeres são outros, os limites se estenderam e o que era prazer há dois mil anos hoje é conservadorismo. Em outras palavras, a crítica literária está alguns passos atrás da literatura contemporânea.
Quem são os autores que aparecem nos livros didáticos? São aqueles consagrados, institucionalizados. E aqueles que aparecem na lista dos mais vendidos? Ou são estrangeiros ou são aqueles que escrevem alguma coisa mais perto de auto-ajuda do que de literatura. Por quê?
Quem sabe não seja porque se atribui apenas aos críticos o trabalho de pensar... Ou seja, nos livros didáticos os autores já vêm pensados, discutidos e nas prateleiras os livros de auto-ajuda não precisam ser pensados.
Autores contemporâneos não têm espaço nem são estudados e autores consagrados são pensados e vistos pela escola de forma distanciada, não são trazidos para a realidade dos alunos.
Parece-me que enquanto a mídia e a escola contribuem para formar leitores passivos, por outro lado a crítica está preocupada em afirmar conceitos. E assim vai se alargando cada vez mais esse espaço entre o prazer do texto e uma visão mais crítico-reflexiva. Espaço esse que não deve existir, pois é justamente aí que reside o prazer de um bom texto.