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Contos-->MOSKA KRISTO - 2ª PARTE -- 04/01/2004 - 17:26 (Marco Antonio Cardoso) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
- Isto é incrível, é uma maravilha, um marco na história da humanidade. Vamos para o estúdio de “Questa Itália”!
Havia muita confusão no estúdio. Os apresentadores do programa estavam preparados para a entrevista da manhã, com um conhecido juiz caçador de mafiosos, quando foram informados da mudança drástica na seqüência do programa. Os técnicos se preparavam para closes com zoom, para captar o exato momento em que a mosca proferisse seu discurso.
Na pequena platéia sentia-se um certo desconforto. Comentava-se que uma aberração seria apresentada, desvirtuando o estilo do programa, que era assistido até pelo Papa. Talvez por isso é que o diretor fez tal alteração, para que a mensagem de Moska Kristo chegasse aos ouvidos do Sumo Pontífice e causasse, como de fato causou, uma grande comoção na igreja católica e em toda a cristandade.
Moska Kristo veio voando até o estúdio, como uma mosca qualquer, mas qualquer coisa que fosse, nunca seria uma coisa qualquer.
Eu tentava imaginar o que ele falaria na tv, mas quando caia em mim, via o tamanho absurdo que se apresentara ao mundo. O salvador, o filho de Deus, voltou ao mundo como uma prosaica mosca, e iria apresentar-se num programa de tv para todo o planeta. Aquilo era o fim da picada, ou quem sabe, o fim do mundo mesmo.
A apresentadora responsável pela entrevista com celebridades estava eufórica, mas ao mesmo tempo nervosa e visivelmente irritada com aquela situação que a deixava tão vulnerável frente às câmaras, coisa que ela conseguiu dominar no passar dos anos nesta profissão.
Eu me sentei numa cadeira ao lado de uns equipamentos, mas dava para ver Moska Kristo pousado ao lado de um microfone de lapela, que permitia ser focalizado por duas câmeras.
O programa foi ao ar. A apresentadora, uma belíssima senhora de seus trinta anos, armou-se de um grande sorriso e se dirigiu aos telespectadores:
- Bom dia a todos que assistem Questa Itália! Queremos pedir desculpas a todos porque não apresentaremos a entrevista anunciada, por um motivo que pode parecer hilário, mas que trará profundas mudanças em cada um de nós.
Ela lia o texto num monitor que ficava em sua frente, o texto que era escrito na hora pelo diretor do programa, sentado no chão, digitando em seu laptop.
- Hoje nós entrevistaremos nada mais, nada menos que uma mosca falante. Isso mesmo, não desliguem seus aparelhos. Não se trata de um número de ilusionismo, nem mesmo ventriloquia, mas um fato que irá fazer com que todos nós nos questionemos sobre as verdades que alimentamos em nossas vidas. Esta mosca não é uma simples mosca que aprendeu a falar, mas deixemos de conversa e passemos a palavra ao nosso convidado desta manhã, afinal, em boca fechada não entra mosca.
A última frase da moça foi um improviso que irritou o diretor, pois conferiu um tom sarcástico ao programa.
As câmeras focalizaram a mosca, enquanto ouvia-se a voz da apresentadora perguntando seu nome.
- Meu nome é Moska Kristo – disse o inseto – e este nome que pode parecer uma pilhéria, tal qual a que nossa amiga aqui ao lado fez há pouco, mas na verdade é um nome pelo qual fiquei conhecido na última vez em que vivi na Terra, porém em um corpo humano.
- Moska Kristo, isto quer dizer que você é a reencarnação de Jesus Cristo?
Neste momento ouvi um murmúrio de um técnico, mais ou menos assim: Meu Deus, isto é blasfêmia.
- Sim, isto é a pura verdade. As autoridades da igreja católica suprimiram toda e qualquer menção que se fez sobre o assunto nos escritos sagrados dos judeus e também nos escritos modernos sobre a minha vida como Jesus, para impor uma dependência do ser aos ditames da instituição, que rapidamente perdera os objetivos primordiais para se tornar meramente uma instituição temporal. A reencarnação é uma verdade, que as mentes prisioneiras nas mesquinharias materiais não admitem sequer cogitar, muito embora o vulgo consiga encarar com naturalidade esta condição comum da vida.
- Mas a reencarnação pressupõe que os seres humanos não encarnem em formas inferiores de vida. A doutrina da metempsicose é considerada falsa até mesmo por aqueles que defendem a reencarnação.
- Pois então fiquem vocês sabendo, por estarem me vendo, que a metempsicose, ou como queiram chamar, não é de todo falsa, mas é necessária para a própria evolução do espírito. Além do que, Deus, quando criou do puro amor as formas que por este mundo já passaram, não determinou escalas de qualidade, mas apenas ponderou necessidades. Os seres humanos, em seu mundo diminuto, quando não conseguem ver o que de maior o espera, é que repartem as coisas e dão valores a isso e aquilo, de acordo com suas impressões errôneas. Há mundos em que os humanos prezam os excrementos mais que os diamantes. Eu mesmo, somente estou falando a vocês porque pude fazer algumas pessoas me aceitarem como que digo que sou, até mesmo por se tratarem de seres que conviveram comigo quando andava como homem nas terras dos judeus.
Os telefones tocavam freneticamente. As perguntas dos telespectadores eram muitas. O superintendente da rede vinha e voltava, falando alegremente ao diretor que os índices de audiência nunca foram tão altos. A entrevista prosseguia.
- Eu estou, simplesmente, maravilhada, senhor Moska Kristo. Quando me disseram que eu entrevistaria uma mosca falante, nunca imaginei que estaria diante de, de...
- Minha cara., Fico feliz por perceber que me aceitas em seu coração, mas muitos nesta assembléia estão apavorados, outros espumam de ódio.
- O senhor não imagina o que se passa no mundo nesta hora. Mas voltemos ao bate-papo. Sua primeira missão foi uma missão de amor, e esta agora?
- Continua sendo uma missão de amor, mas por vezes o amor deve provocar algum espanto, quando os corações se protegem dele revestindo-se de couraças de ódio e egoísmo. Não estou muito distante do que fiz em Jerusalém, quando esperavam um messias vestido de glória e armado até os dentes para combater os romanos, e vim eu, montado num burrico, para simbolizar a humildade e a paz, que é o que deve interessar a todos os seres. Infelizmente queriam um messias de guerra, e escolheram a Bar Abbas me condenando à cruz. Morri como fora determinado, e fechei o ciclo que me aprisionava na Terra. Minha volta era tida como certa nos primeiros momentos do cristianismo, mas com o passar do tempo, as pessoas, oprimidas por seus medos e pelos tiranos que se armam frente aos homens para combater a paz, esperavam novamente um guerreiro, um príncipe engalanado, montado num corcel branco decorado com ouro e jóias reluzentes, descendo das nuvens... É uma imagem linda para um conto de fadas, mas nunca poderia ser real, porque minha volta teria que sacudir nos corações todo o orgulho que há depositado em seu fundo lodoso, destronar o egoísmo cultivado à base das exclusões dos semelhantes, por aqueles que se arvoraram a donos do céu, escolhidos para retornar ao paraíso, não se importando que quase toda a humanidade fosse condenada ao fogo do inferno, desde que eles estivessem salvos. Se uma única ovelha se extraviar, o pastor irá busca-la. Não deixará que uma única pereça, porque quase a totalidade do rebanho está a salvo. Para Deus não existe quase. Ele criou tudo e tudo deverá retornar a ele, no final.
- Não sou especialista, mas estou recebendo algumas perguntas de teólogos que dizem estar o Senhor contradizendo dogmas antigos e misturando cristianismo com budismo e hinduismo. Alguns religiosos estão acusando-o de herético, e há muitos pedidos para tira-lo do ar. Isto me faz lembrar daquele trecho dos evangelhos, quando Jesus invadia o templo, repleto de ladrões e comerciantes. Vieste trazer a paz ou a espada?
Naquele instante vi surgir na porta do estúdio o superintendente. Tinha o semblante preocupado, diria até mesmo abatido, e cochichou algo com o diretor, que o deixou aturdido. Levantando-se, veio até mim e disse-me que o Papa ligou, irritado, e ordenou que a entrevista fosse retirada do ar, por se tratar de grande ofensa à Santa Igreja Católica. Ficamos longos segundos em silêncio, que ele interrompeu com uma bravata: “Ao diabo com a igreja, prefiro a verdade.”. Depois ligou para o superintendente e discutiu calorosamente, até convence-lo em manter Moska Kristo no ar.
Algumas pessoas na platéia estavam começando a se manifestar ruidosamente, o que demandava maior contingente de seguranças para manter a ordem. De qualquer forma, eu já estava me inquietando para onde tudo estava se encaminhando.
- Respondendo sua pergunta, digo a você e a todos que vim trazer-lhes a paz, mas não aquela concebida na mentira. A paz não é ausência de violência e sim a cortesia e o amor que se possa ter para com o próximo. Não há paz quando as pessoas se armam esperando um gesto agressivo dos outros, pois o ato de armar-se já é agressivo. Não há paz quando apenas um grupo seleto pode usufruir determinadas prerrogativas, enquanto multidões vivem em meio ao sofrimento e a angustia. Vim trazer a paz, uma segunda vez, e de uma forma contundente e direta, para não dar margens às segundas intenções dos fazedores de seitas, que buscam dividir os homens enquanto toda minha mensagem visa apenas uni-los.
- Se era preciso que viesses uma outra vez, porque a forma de uma mosca?
- Se aqui me apresentasse na forma de um homem, seria mais um, mais uma voz que diz estar carregando consigo a mensagem, mas são tantos os embusteiros, tantos os enganadores que, nestes tempos ávidos de esperança se lançam a enganar os pequeninos amados de meu Pai, buscando construir seus impérios de luxo sobre a miséria dos homens, que preferi chamar a atenção de todos de uma forma mais enfática.
- Mas, porque a mosca?
- Porque é um ser tão odiado, tão combatido, um ser que todos devotam grande repulsa, que seria como uma bofetada para acordar de uma vez todos os incrédulos. Aqui está uma maravilha, uma obra de Deus para chamar os homens de volta ao caminha da paz e do amor. E aqui estou eu para passar esta mensagem no tempo em que vive uma mosca. Ouça-a e viva-a, pois esta é, de fato, a última chance.
Naquele momento uma mulher enlouquecida começou a gritar e se lançou ao palco, diante das câmeras, sapato em punho, procurando acertar Moska Kristo. Ela gritava histérica, chamando-o de demônio, e sua invasão pois fim ao controle dos seguranças. O programa saiu do ar e Moska Kristo fugiu voando, e ao passar por mim disse: “Espere-me nos fundos.”.
Um pandemônio tomou conta do estúdio, e os seguranças estavam fechando todas as saídas para tentar conter aqueles que queriam a todo custo entrar para matar a mosca. Eu consegui deixar o lugar o mais rápido possível e me dirigi para os fundos do prédio, onde achei Moska Kristo pousado sobre uma caixa de papelão.
- É verdade que você vai viver a vida de uma mosca? Apenas vinte e quatro horas?


www.poetadopovo.kit.net/

Marco Antonio Cardoso









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