Quando eu era criança, e ía visitar minha tia Felicia, ficava abismado
com o estranho costume do meu tio Oscar; após o almoço de domingo,
com aquele cardápio que eu sempre gostei, ele se trancava no único
banheiro da casa e, lá ficava a tarde inteira. Eu e meus primos,
bricávamos num quintal grande, subido e pendurados numa goiabeira,
e numa cerejeira, comendo os frutos, depois íamos ver o trem das 15 horas,
passar cheio de vagão com destino a cidade de São Francisco do
Sul.- SC. Após a passagem do trem, começava jogar futebol num
campinho de terra, atrás da casa do meu tio e só voltava-mos ao
pensar no lanche com pão caseiro, tipo alemão ou italiano. Com leite
quente e açucar exposto na mesa da cozinha. Na verdade eu não sei se
a vida era melhor naquele tempo, porque dificilmente guardo emoções
de épocas, só sei que ainda não fora registrada pela nossa Literatura.
Antes de ir até à mesa tomar o lanche, ía ao banheiro, lavar as mãos.
A porta se encontrava trancada. Batia, meu tio respondia: está
ocupado. Poxa, mas o senhor tá ai desde meio-dia , o que faço?
faça no quintal, ele gritava. Eu o ouvia dobrar as páginas do jornal,
A Noticia , de Joinville -SC. Eu corria até as goiabeiras e me virava sem
problemas. E lava-va as mãos no tanque das roupas sujas. Até
achava engraçado aquela liberdade, por hoje em dia temos as praias
do nudismos. Se tenho alguma imagem da minha infância é a de meu
tio Oscar More, estação ferroviária e o bairro da volta redonda onde
eu e minha familia morava. Este meu tio todos os domingos, ficava
várias horas trancado no banheiro. Quando ele abandonava seu
posto, minha tia começava o atálho da limpeza, na linguagem tipíca do
casal. Eu perguntava por que ele não conseguia ler o jornal em outro
lugar, na sala por exemplo, ou na varanda?. Nunca ouvir sua resposta.
Engraçado na minha memória o domigo só se encerrava quando terminava
a missa com o padre Anibal as 19 horas. Só depois de alguns anos
descobrir por que meu tio se refugiava no reservado. Estava em
busca de sossego, Um amigo artista plástico, me conta que tem por
hábito levantar duas horas antes de sua mulher e filhos, para não fazer nada.
Quer dizer, para ler jornal e revistas no banheiro, fazer a barba, tomar banho,
sem pressar o café da manhã . Participamos juntos de uma exposição
coletiva de artes cubistas, em Santa Catarina, e o vi pedindo à moça
da recepção do hotel, que o acordasse sempre muito cedo. Mesmo
longe de casa, segue a rotina, como se a mulher e os filhos estivessem por
perto. Por que ? Quis saber. É o unico momento do dia em que estou sozinho e
posso pensar na vida, me respondeu, pensar no que irei fazer ao longo do
dia. Lembro-me de um escritor que só consegue escrever quando
todos na sua casa estão dormindo, ou escreve bem a noite ou
levanta-se antes das galinhas. Um dia ele já me mostrou passagens
de seus livros realizados enquanto a familia está acordado. De
fato percebe-se um texto então nervoso, por que não ?, truncado.
É porque neste momento - ele me conta, minha mulher pede tantas
coisas, reclama, fica um inferno. Mas eu em particular como artista,
poeta, contista; cada dia penso mais que o homem é uma espécie
que busca seu esconderijo dentro da própria casa. Esconde-se da
mulher, dos filhos, dos parentes, até dos amigos. Meu pai, Salvador,
por exemplo trancava-se no quarto e lá ficava lendo jornais, a bíblia,
cartas e outros, ouvindo a voz do Brasil pela radio tupi etc...
Ele achava indispensável, naquela época da ditadura, estar bem
informado , apesar da censura. Só aparecia em público quando
ía ao bar tomar uma ceverjinha. Tinha também a estratégia de colocar
o rosto quase dentro do jornal ou livro, então não ouvia e sequer via nada
além de letras impressas. Eu estou desenvolvendo meus trabalhos
como profissional da área de saúde, no Distrito de São José do
Albertópolis. Chamado popularmente de Guaritá, há 30 KM do
centro de Guaira-SP. Pego o onibus quase todos os dias, sempre
levo o jornal Estado de São Paulo, e outras vezes o jornal O GUAIRA
ou A CIDADE. Ao chegar no distrito, vou até o posto Médico e,
começa chegar alguns moradores, perguntando SR. Angelo, trouxe
o jornal? sim respondo, quero ler as ultimas noticias de Guaira.
O que eu faço é importante, estimula á leitura, atualiza conhecimentos,
porque os livros , os jornais, revistas etc... Dar ao leitor além do
texto escrito, a capacidade de ser comunicar corretamente, usado
uma linguagem coloquial mas apurado. Mas para finalizar este
conto, acho que meu tio Oscar, ficava lendo no banheiro, por que
já estava um pouco idoso. E quando acontece isso, a gente fica
lento e sonolento.-
-José Angelo Cardoso.-Poeta, contista , artista plástico. |