Sentou-se no banquinho e um violão. Seu amor uma canção. Os tambores retumbaram e vibraram ao som do ranger da madeira. Bruno rodopiou no próprio eixo e sua feição modificou-se de repente. Surgiu das trevas uma entidade superior que jazia escondida e perdida nos esconderijos distantes das almas presentes. Madalena e o Zeppelin alçando vôo. “Sujou! Fui descoberto!”. Ninguém entendeu e até mesmo acreditaram que era tudo brincadeira. “Nonada”. Era sério... Ninguém sabia, e ninguém viu acontecendo. Mas aconteceu. “O diabo na rua, no meio do redemoinho...”. Bruno sambou e gritou como uma entidade. Riu dos presentes e dos ausentes. “Tarcisio sumiu! HAHAHAHA! Douglas Lobo também... Levando o surrealismo pra lá de Marrakeshi! Tantos outros sumiram, e tantos outros, porém, apareceram. Foi tudo coincidência, em função do irreal! HAHAHAHA!”. Ninguém entendeu, e tão pouco ficaram satisfeitos. Muito pelo contrário, ficaram apreensivos e desconfiados. “Sou eu... Aquele por quem vocês procuram, e jamais encontram... Sou Usina dos Sábios Impostores da Nova Arte... Onipresente em todos vocês! HAHAHAHA!”.
Os tambores continuaram zunindo nas cabeças pensantes dos presentes e ausentes. Ninguém conseguia emitir som algum. Todos perplexos e estupefatos, sentindo a cabeça zonza e o chão sumindo debaixo dos pés. “Sou eu mesmo... Podem apostar... Sou eu...”. Ninguém queria acreditar. Felix se mordia de pavor, Milene assustada esquecera sua mágoa para com o roteirista. Todo o resto perplexo, mal conseguia emitir palavra que fosse um suspiro, desaprovação, ou apoio. Nem mesmo Bruno sabia o que acontecia, apenas rodopiava e girava como a pomba gira louca e enraivecida da loucura de girar no mesmo eixo. “HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!”.
Bruno rodopiava e sambava, gritando numa língua negra e esquecida de muito tempo atrás. “Ninguém sai daqui! Ninguém sai! HAHAHAHA! Ninguém!”. Ninguém saia, nem indicava intuito de se mexerem. “Quem fala aqui e agora, é Madama Madá! HAHAHAHA! Madama Madá! Sou eu... HAHAHAHA! Madá!”. O cenário virava terreiro de candomblé, macumba brava, e magia negra, enquanto a pomba gira girava enlouquecida, entornando cachaça pelas ventas e axilas, e girando, girando, girando, jiando... Espírito de tudo, que tomou forma de uma jia, dando o primeiro pulo... Jiando, Jiando, Jiando, girando... “Devem-se adorar as jias... HAHAHAHA!”.
Madalena fora risonha e faladeira, dizia que a vida era uma ponte, onde se atravessava por todo sempre. Dizia também que sentia uma forte paixão para com os feios, e não podia deixar de amparar as almas mais fracas dos mais feios e imundos. Gostava da podridão humana, mas detestava o velho placar dos textos mais lidos, e sentia que era tudo irreal. Achava que os próprios escritores manipulavam o placar com acessos irreais de seus próprios textos. “Todo mundo já fez isso! Confessem! HAHAHAHA!”. Madalena achava o cúmulo da insegurança aquela toda insegurança. O placar devia ser coisa sagrada, pra medir a empatia do autor com o público. Mas sentia que jamais funcionaria, devido ao número elevado de autores publicados. Também não gostava do quadro de avisos, que segundo ela, tornara-se um ‘chat’ de enaltecimentos. Madalena não era pura, mas sabia toda a verdade. “Porque acham que ela morreu assim? HAHAHAHA! Descubram se puderem...”.
“Eu usei todos vocês! HAHAHAHA! Todos vocês! Se querem culpar alguém? Culpem-se a si mesmos! HAHAHAHA! Culpem-se a si mesmos! HAHAHAHA! Ninguém é o matador... Mas mesmo assim, todo mundo é o matador! Vocês me entenderam? HAHAHAHA! Todo mundo é o matador! Madalena foi morredora... HAHAHAHA! Ela morreu sim, por isso é mesmo morredora... HAHAHAHA! Todos vocês morreram com Madalena... HAHAHAHA!”.
Dizendo isso Bruno caiu do banquinho e acordou do transe. Os tambores pararam de zunir e quietaram-se, ficando em silêncio absoluto. Todos se olharam e enfim, perceberam o que ocorrera. Bruno caído e ainda absorto em seu transe mediúnico, jazia sem vida no chão frio do cenário. Parecia desacordado, mas aos poucos foi dando sinais de vida e levantando a cabeça, e olhando para todos presentes. Assustado como todo mundo, ele sorriu aliviado, mas nem tanto mais do que todo mundo. “Me lembrei de Luiz Gonzaga... Numa canção que dizia que ele só havia dado alguns furinhos, o cabra é que era morredor...”.
Então você se lembra, indagara Felix, para logo descobrir que Bruno não se lembrava de nada além da música de Gonzagão. “Só me lembro de Luiz Gonzaga, e suas canções: Luiz, respeita Januário... Respeita os oito baixo do teu pai...”.
Ninguém podia crer no que vira, e só mesmo Bruno não sabia de fato, o que ocorrera, pois não se lembrava de nada... Nada mesmo... Nonada...