Pai, por favor deixa de gritar, até parece que estamos sobre fogo!
Mãe, para de chorar, eu prometo que me portarei melhor.
Porque não podemos ser uma família?
Eu sei que é verdade, que fugir da gritaria, e dos problemas, não me vai fazer ser uma pessoa melhor. Vamos apenas fingir, que não temos diferenças, que tudo é perfeito.
Que linda, casa com lindas fotos na lareira, onde todos estamos felizes e nos rimos das brincadeiras que poderíamos fazer.
Prometo que vou falar com os meus irmãos, que passará a ser diferente, a bebida e a irresponsabilidade vão deixar de existir. Prometo.
Passam a vida a discutir sobre dinheiro, sobre o meu irmão e a minha irmã. Eu prometo que tudo vai mudar, será que podemos ser simples?
Pai, eu sei que a mãe te ama. Diz-lhe também. Apesar de todas as palavras feias que ela diz, o amor existe. Não quero mais discussões. Pára de bater!
Quero que passemos esta fase má, que passemos a ser normais.
- Eu bem vi como ele te olhava!
- Só vês o que te convém!
Chega de lamúrias, de palavras sem sentido, qual é o significado?
- Que cor de cabelo é essa? Ele gosta mais assim?
- Porquê, a tua amante é melhor que eu?
Por favor pai, para com esse som...
- Quando é que o teu filho começa a trabalhar? Não me digas que torceu outra vez o pé?
- Devias de ter pena da pouca sorte do rapaz!
- Pouca sorte! Tem 35 anos, comida, cama de borla, e ainda lhe pagas os vícios! Pena!
Vamos voltar a tentar, vamos fingir...
- Vê o que fizeste com a tua filha mais nova, vê! Já com um desgraçado ao colo! Sem dinheiro para a renda.
- Também és pai dela, cabe-te ajudá-la! Só pensas na mais velha, para ti só tens uma filha. A mais velha.
- Ou te calas, ou levas!
Apesar dessas palavras amarguradas, o amor resiste, não o deixem fugir, por favor. Não sou diferente de ninguém, apenas tento sobreviver.
- Bate! Bate! Que eu chamo a polícia! Bate!
- Está calada! Só te aviso mais uma vez!
Vamos voltar a viver, já só quero fingir que somos aquelas fotos que estão nas prateleiras das lojas de móveis. Onde todos irradiam felicidade, nada lhes toca e tudo é bonito. Eu falo com os meus irmãos, vou tentar ajudar a pagar a renda, tentar que ele deixe de beber. Eu prometo.
- Vou para a rua, só para não te ouvir mais!
- Vai! Só sabes fugir!
Pai, por favor não te vás embora? A mão não quis dizer isso, ela ama-te! Todos gostamos de ti. Faz com que ela pare de chorar...
Vira-te, olha para mim, eu adoro-te! Não vás! Passarei a ser melhor, vou falar com os meus irmãos, não vás!
Passo a dormir de luz apagada, e não voltarei a molhar a cama. Prometo que o meu irmão vai trabalhar, e deixar de beber. A mana vai voltar a estudar…
Eu prometo.
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