Números são números, nada mais que números.....
Há mais de vinte anos que ao deitar, costumo fazer as contas do Brasil antes de rezar e pedir a Deus que se compadeça dos brasileiros. Devo ser um mal Cristão, porque toda noite o nosso déficit tem aumentado em minhas contas.
Lembro-me quando o rombo era uma criança e minha maior preocupação era a maldita inflação. Há vinte anos o garoto era de apenas U$ 50 bilhões. A inflação galopava pelo salário dos brasileiros e o déficit público começava a chegar a idade adulta. No princípio não me incomodava muito, porque a inflação era a minha preocupação e também a minha atividade diária. Lembro-me que consegui até a ganhar dinheiro com a maldita. Mesmo assim, sonhava em poder comprar o pão nosso de cada dia pelo mesmo preço todos os dias do ano.
Depois de vários anos, o que tanto esperava chegou. O plano Real me fez aliviar uma série de problemas. Deixei de estocar comida, roupas, eletrodomésticos, aplicações de curto prazo e pequenos investimentos que um classe média faz normalmente para se defender da inflação.
Foi-se uma preocupação, veio a outra. Agora o bicho era os juros que se estava pagando com a estabilidade. Quando vi o dólar baixar de 1 real, e o mercado financeiro pagando juros de até 65% ao ano(no início do plano real), comecei a fazer outra conta. Nossas reservas cambiais chegaram a 75 bilhões de dólares. Esse dinheiro no entanto não veio para ficar. Chegava, pegava o juro e ia embora. Voltava na semana seguinte e retornava com mais juros. Quem estava pagando os juros ? - A viúva, caros amigos. E como?- emitindo papeis de curto prazo, e aumentando nosso déficit escritural ou déficit público.
Logo surgiram as idéias das reformas. Reforma da Previdência, do Judiciário, Administrativa, Eleitoral, etc. A principal e primeira a ser efetuada, nada. Sim, a primeira deveria ser a tributária e fiscal. Ou seja, primeiro deveríamos saber o quanto ganhamos para depois saber o quanto poderemos gastar. Em vez disso, primeiro procuramos saber quanto gastamos e depois fomos procurar receita para cobrir as despesas. Foi assim que muitos da iniciativa privada quebraram e a classe média se esfacelou. Aprenderam com o governo e com a inflação.
Diariamente fazia a conta das reservas em dólar e da dívida interna, e avisava a meus consultados que em futuro próximo a bomba iria estourar. O pais não crescia, as exportações não superavam as importações, e o dinheiro "quente" elevava a Bovespa para estratosfera. Chamaram-me de terrorista, pessimista e outros adjetivos menos suaves. Começaram a chegar as crises internacionais e entramos de cabeça nelas. Seguiu-se então a saraivada de pacotes, e reformas pela metade de tudo que deveria ter acontecido na época das vacas gordas. Muito tarde. Agora enfrentamos um congresso que congrega a maior massa de egoísmo e interesses pessoais que já se viu na história deste país. Os partidos da situação entraram em luta encarniçada pelo poder e a oposição se aproveita para se juntar aos desencantados e procrastinar todas as medidas urgentes que têm que ser aprovadas. Os três poderes entram em luta quase corporal. Entre cada poder há desentendimentos explícitos e públicos. Partidos procuram extorquir do executivo parcelas do poder. No Plano Plurianual, (PPA), ouvi Deputados falar em cifras de 1 trilhão que seria administrada pelo Ministro do partido A, B ou C. A maneira como o problema chegou ao público, foi como se essa imensa quantia fosse ser dividida para os partidos e não para o país. Em suma uma baixaria de primeira grandeza.
Segundo dados econômicos de revistas e do governo, nosso PIB beira os 800 bilhões. Segundo ainda essas informações, as receitas federais, estaduais e municipais, arrecadam 35% do PIB, ou seja 246 bilhões. Já o Secretário da Receita Federal, afirmou que para cada R$ 1,00 arrecadado, existem R$ 2,00 sonegados, o que representa fábula de 493 bilhões. Se isso é verdade, e todos sonegadores pagassem seus impostos como manda a lei, o país arrecadaria 739 bilhões de reais por ano, ou seja 92% do PIB. Aí cabem algumas perguntas:
a) Qual o investidor interno ou externo que investiria seu dinheiro para ter uma margem de 8% para comprar matéria prima, pagar seus empregados e ainda levar uns 0,00001% para casa ?
b) Nos antigos países comunistas a margem não seria um pouco maior ?
c) Será que a sonegação é realmente nessa proporção ?
d) Onde o secretário foi buscar esses números ? (ver quadro abaixo)
RECEITA em Bilhões
PIB ARRECADAÇÃO SONEGAÇÃO SALDO PIB
795,1 246,5 493,0 55,7
Outro aspecto a ser comentado é a evolução de nossa dívida interna e externa. Se continuarmos nessa balada daqui a 12 meses estaremos com a dívida maior que o PIB. Hoje nossa dívida interna e de 495 bilhões e a externa de 288 bilhões. A interna pagamos juros de 19% aa., a externa de 5,25%. Em doze meses o principal mais juros das duas dívidas alcançará a cifra de 892 bilhões, enquanto que o PIB crescendo 3% no ano 2000, chegará a 819 bilhões ou seja 73 bilhões menos que vale tudo que se produz no país. Em outras palavras só vai sobrar o terreno e a população.(ver quadro abaixo)
DESPESAS CORRENTES
DIVIDA INTERNA JUROS 19 aa. JUROS MENSAIS ACUMULADO PIB EM 99
495 94,1 7,8 589,1 795,1
DIVIDA EXTERNA JUROS 6 aa. JUROS MENSAIS ACUMULADO
288,5 15,1 1,3 303,6 PIB EM 2000 DÉFICIT PIB
783,5 109,2 9,1 892,6 819,1 -73,5
Junte-se a isso as demais despesas do país, tais como Previdência que nos deixará outro de déficit de 30,6 bilhões, mais as despesas com saúde, educação estradas etc. Uma coisa é certa, não podemos gastar mais que os 246 bilhões que arrecadamos. Como viabilizar é outra estória. Mas para começar, devemos eliminar o desperdício que á causa primeira de tudo que esta acontecendo. Há desperdício de energia, água, papel, inteligência do governo e do povo.
Uma reforma no Judiciário, limitando o processo a três instancias e somente sobre o mérito, aprovação da súmula vinculante, informatização da justiça em todos os níveis, seriam formas de evitar o desperdício de milhares de horas de trabalho dos juizes e daqueles que dele necessitam, ocasionando uma economia de bilhões de reais.
No poder Legislativo limitar o número de Senadores para 25, Deputados Federais para 250, Estaduais para 25 e Vereadores para 10. Limitar ainda o numero assessores parlamentares para 3 em todas as instancias.
No Poder Executivo limitar o número de Ministro para dez, Secretários de Estado para dez e Secretários Municipais para cinco.
Essas providências nos daria uma economia de 100 bilhões, se evitaria o desperdício, e país andaria fora dos caminhos burocráticos e cartorários.
São idéias, são números, são atitudes, são pensamentos, são absurdos, são uma série de adjetivos que se todos os brasileiros começassem a pensar no assunto, poderíamos alcançar soluções para o impossível.
A dança dos números é fascinante e criticar é mais fácil do que elogiar, mas será que o problema do país não é a falta de faturamento (crescimento)? - De que adianta aumentar a carga tributária ou continuar com a mesma se o excesso de impostos aumenta a recessão e o desemprego ? - Sabemos que a recessão provoca a queda do PIB e por conseqüência, produzimos menos, exportamos menos, importamos mais e governo arrecada menos impostos. Com isso tomamos mais empréstimos, pagamos mais juros e aumentamos a bola de neve. Se diminuirmos os juros e os impostos, a produção aumenta, a dívida pára de crescer e provavelmente a arrecadação deverá aumentar lenta e gradual, proporcionando ao governo se reabilitar na mesma velocidade. Fica claro no entanto, que a reforma tributária deve ser o ponto de partida para qualquer solução neste país. Deverá ser simples e objetiva. Dos 52 impostos e contribuições, deverão ser reduzidos para seis ou oito no máximo. Os pagamentos dos impostos deverão ser simples e inteligíveis para qualquer cidadão. O total de todos impostos não deverá ultrapassar a 25% do PIB.
Enquanto a reforma não vem, a dança dos números falsos ou verdadeiros continuarão, mas não façam como eu e alguns brasileiros, que perdem o sono tentando decifrá-los. "Justo Veríssimo" dizia: Palavras são palavras, nada mais que palavras. Parodiando-o digo: Números são números, nada mais que números.
OLINDA, 12/10/99
Mauro de Oliveira
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