DECLARAÇÃO DE AMOR DE LULA A MALUF
Délcio Vieira Salomon
A declaração recíproca de amor político entre Lula e Maluf tem levado a muitas análises e reflexões.
Houve quem chegou a ponto de alistar alguns intelectuais de esquerda petistas para lhes indagar, á guisa de entrevista, como estariam reagindo (ver Folha de São Paulo de 06.07.2012). O desconforto foi geral. Alguns chegaram a escamotear suas convicções ideológicas para tentar justificar o comportamento de Lula, apelando para o velho chavão: em política vale tudo, quando o objetivo é alcançar o poder.
Não me cabe perscrutar se a iniciativa foi só de Lula ou dele junto com os próceres do PT. Se foi só de Lula e todo o PT o apoiou, dá na mesma. De Lula tudo se pode esperar. Seu comportamento político tem mostrado tratar-se de um ser aético, amoral, que se julga acima do bem e do mal.
A mim me parece que o fato é revelador de que nunca tivemos legítima democracia ou de que nossa democracia está doente.
Quando Maluf declarou que não há mais direita, nem esquerda, no fundo acenou para o fato de que não existe mais no Brasil autêntica democracia, pois o choque ideológico que caracteriza os opostos num regime legitimamente democrático há muito já não existe no Brasil.
Talvez, se procurarmos a origem da falácia democrática em nosso país, vamos deparar com um dos fatores geradores no golpe militar de 64, não só porque coroou o revanchismo vindo do tempo do lacerdismo em oposição ao getulismo, como também (ou sobretudo) porque, através de sua ação, Golbery sugeriu a Lula a criação do PT, para acabar com a dicotomia esquerda - direita.
Lula, certa vez (como me lembro!), pouco depois de fundado o PT, declarou que nada tinha de socialista, muito menos de marxista, que seu projeto político era o sindicalismo. Afinal, foi sincero, pois jamais teve condição ou capacidade de entender o significado desses sistemas políticos e filosóficos.
Análise não superficial (o que obviamente não é propósito aqui e agora), por certo revelaria o motivo de muitos ficarem surpresos com a aliança do PT (aparentemente e só aparentemente de esquerda) com o PP de Maluf – a expressão mais forte do reacionarismo da direita.
Anos atrás, Lula não só se aliou, como enalteceu esta figura nefasta à república chamada Sarney. Depois de anos seguidos de criticá-lo, veio a público para abraçá-lo, só faltando beijá-lo na boca, deixando este gesto para a ministra petista, então senadora, Ideli Salvatti.
No fundo e infelizmente o ecletismo político tem sido traço marcante de nossa democracia nas últimas décadas e se agravou com a tomada do poder pelo PT.
Tal constatação me reporta a texto de Henry Lefebvre, quando se referiu a determinada situação política na França. Merece ser lembrado, pois sua observação é bem atual, sobretudo para o momento político brasileiro:
“Essa ideia do compromisso eclético impeliu politicamente a democracia para a crise que iria causar sua perda. A esperança de compromisso entre o fascismo e a democracia - a segunda intenção de misturar certos aspectos do fascismo com certos princípios da democracia - foi, no plano ideológico e filosófico, uma razão da não-resistência à Alemanha hitlerista por parte de muitos democratas amantes do ecletismo político! “(LEFEBVRE, Lógica formal – lógica dialética. 1975, p. 229).
‘Mutatis mutandis’ estas palavras servem de reflexão quando deparamos com este ecletismo ideológico e político no poder, na conjuntura atual brasileira: socialismo com social-democracia com neoliberalismo - esquerda com direita – PT com PP e tantas alianças a revelar falta de princípio e de formação para exercício do cargo de nossos políticos.
Por isso é que disse no início: não temos legítima democracia ou nossa democracia está doente.
Temo que a perdurar tal estado de coisa, agravado pela corrupçpão de nossos políticos e a malversação do dinheiro público – ou seja, a continuar este “zeitgeist” político – estamos caminhando celeremente para outro golpe militar.
Oxalá, ao invés de golpe militar, surgissem neste país autênticos líderes para provocar a tão necessária “revolução branca”, a nos livrar daquela que ainda não tivemos e grandes países por ela já passaram: a legítima revolução, a sangrenta!
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