Marx, e, conseqüente e posteriormente todos os marxistas, comete o grave erro de considerar o indivíduo apenas como produto da sociedade. Isto é verdade até um certo grau. O fato é que é a partir desta premissa que os sistemas socialistas são idealizados e estruturados.
Sabemos o poder que a massificação manipuladora dos meios de comunicação, por exemplo, têm sobre as pessoas. São os conhecidos formadores de opinião. Sabemos o quanto a mídia pode influenciar, contudo, embora muito forte, isto também tem um limite e não é responsável pela formação do caráter das pessoas. Se assim fosse, teríamos uma coletividade com indivíduos com reações completamente iguais.
A partir desta premissa marxista, os autodenominados “socialistas” pretenderam mudar radicalmente o pensamento coletivo e, portanto, individual. Se as pessoas pensavam segundo a cultura burguesa, então, era necessário modificar esta “cultura” nas pessoas, pois estas estavam apenas sofrendo um processo de alienação. Sendo assim, um Estado do proletariado (que era comandado por intelectuais e jamais teve algum proletário participando) deveria ter o controle sobre a cultura e mesmo produzi-la.
O leninismo estrutura estas idéias de forma radical, acabada e definitivamente fechada. Com Stálin o pseudo-socialismo praticado na União Soviética chega ao ápice desta idéia. A opressão política e cultural atinge o extremo. Só o Estado pensa. Só o Estado sabe o que é cultura e, portanto, o indivíduo deve pensar segundo o pensamento do Estado. Qualquer pensamento discordante será considerado uma traição dos ideais revolucionários proletários.
A revolução cultural implantada na China por Mão chega ao absurdo de tentar eliminar qualquer traço de uma cultura milenar como é a chinesa. Sartre, incorporando as idéias de Freud, de forma inteligentíssima, argumenta favoravelmente, afinal, segundo Freud, o indivíduo era produto de seu meio, e torna-se um maoísta. A revolução cultural maoísta fora a coisa mais absurda e burra que a humanidade conheceu.
A partir da idéia dialética exploradores x explorados, podemos pensar apressadamente que esta conclusão não está tão errada, contudo, mesmo ela desmascarando o que há por trás do pensamento burguês dominante, é extremamente reducionista. O ser humano é muito mais complexo.
Para tentar redimir e mesmo reavaliar sinceramente estas idéias socialistas, alguns teóricos marxistas tentaram pensá-la melhor. Não foi à toa que o italiano Antônio Gramsci virou moda entre os intelectuais de esquerda em virtude de suas idéias a respeito do aspecto cultural de um povo.
É óbvio supor que muitos que desejam o poder pretendem ter domínio sobre os outros, principalmente o domínio das idéias. É evidente também que não há pior ditadura do que a de direita que visa exclusivamente a defesa de interesses pessoais. Nada justifica uma ditadura e, muito menos de direita. Entretanto, qualquer forma de ditadura é abominável e inaceitável.
É óbvio que nenhuma ditadura irá conseguir impedir a liberdade individual. Há dois ícones ocidentais que representam bem esta condição. São eles Sócrates e Jesus Cristo. Mesmo diante da repressão do Estado ambos atingiram o ápice da liberdade e tornaram-se exemplos e símbolos máximos desta. Mesmo que estes dois homens não tenham existido o simbolismo representado por ambos continua vivo e válido.
Um homem pode ser completamente acorrentado, ter os membros amputados, etc, e ser livre. Todavia, a liberdade de expressão, a liberdade de escolha (evidentemente quando não afeta a liberdade alheia e seus direitos) tem que existir seja em que sistema for.
É lógico que a mais-valia, a propriedade privada (aquela que envolve interesses coletivos), etc., não foram criação de Marx, mas uma constatação. Elas são absurdas. Precisamos socializar os meios de produção. A exploração econômica é uma praga humana. No entanto, precisamos repensar também o papel do Estado como coordenador desta socialização. Os modelos de Estados, chamados socialistas que conhecemos, tornaram-se os capitalistas. Ou seja, o Estado passou a ser o explorador, com todos os defeitos dos concentradores de renda.
O revisionismo soviético ocorreu por uma necessidade. O Estado, em essência, estava praticando o capitalismo, porém, tentava desconsiderar o lucro, assim, estava fracassando como sistema econômico.
Não foi à toa que, por exemplo, na União Soviética a glasnost (transparência) e a Perestroika (reestruturação) os cidadãos comuns ajudaram a demolir o Estado. A falência do sistema em todos os sentidos era evidente. Havia se esgotado.
Isto significa que o capitalismo está certo? Não. O capitalismo é absurdo. Isto significa apenas que não podemos construir um socialismo sem liberdade, onde o Estado seja, contraditoriamente, forte demais, ou seja, uma ditadura.
Enfim, nada de bom será construído sem liberdade. Quem a teme senão os hipócritas, os egocêntricos?
A liberdade sempre será uma conquista individual. E, é este espírito de liberdade individual que vai refletir na sociedade em que o indivíduo livre atua.
O voto, apesar dos limites que conhecemos, ainda é um grande exercício para a liberdade coletiva. É uma grande oportunidade de aprendizado. E um aprendizado se faz com erros e acertos. Este direito temos que ter para pudermos evoluir e nada e ninguém pode e tem o direito de interferir nisto.