993300>Os membros do actual Comité Central do Partido Comunista Português devem estar boquiabertos com a multidão que acorreu em surpreendente avalanche ao funeral do doutor Álvaro Cunhal...
Estou a imaginá-los, de cotovelos correctamente pousados sobre a mesa de reuniões, mas intimamente esfregando as mãos no ambiocioso coraçãozinho político, perplexos com o êxito que foi a morte do seu mais importante e fundamental líder.
Estão confusos e não perceberão, em face de tão deslumbrante hipótese, porque diacho o partido só logra entre 10/5% do eleitorado e não sai disso há 30 anos.
Eu explico clara e sucintamente o fenómeno que ocorreu.
É adquirido que 80% da população portuguesa - quiçá até dos 300 milhões lusófonos - não gostam íntima e convictamente, induzidos pela propalação auditiva, de fascistas nem comunistas. Gostam, sim, da Nossa Senhora de Fátima que, além dos fascistas e dos comunistas, os livra uns dos outros. Adiante...
O passamento de João Paulo II envolveu largas centenas de milhões de pessoas interessadas no grande acontecimento que foram as suas exéquias. No caso, a televisão portuguesa levou a casa dos portugueses o funeral do santo padre em pormenor. Quantos deles não teriam almejado participar ao vivo em tão exemplar e concorridíssima romagem, mas a distância e a situação económica não o permitiram?... O desejo ficou no coração e entranhou-se espontâneo no subconsciente.
Então, quiçá o santo Karol Wotila - foi-o deveras terrenamente em pele e osso - sentisse no céu o desejo íntimo das almas lusas e, zás, fez o milagre: "Vou chamar aquele malandrozinho do Cunhal e proporcionar àqueles benquistos crentes, tal como Deus por linhas tortas, uma festa de arromba às direitas...".
De facto, o cortejo fúnebre do doutor Álvaro Cunhal foi uma festa rija: uma urna com conteúdo polémico, nos nossos dias, começa a ser um espectáculo muito mais atractivo do que um grande jogo de futebol. E, claro, acresce que ainda por cima é de borla...
Por consequência, senhores do PCP, se porventura desejam uma boa votação já em Outubro, vejam lá se é possível fazer coincidir o funeral do actual líder com as eleições. É que líderes - então não é? - há-os aos montes!...
António Torre da Guia |